A ÚLTIMA LIÇÃO DA PROFESSORA M


Conheci a professora M. há cinco anos,foi numa academia de atividade física.No início os cumprimentos formais.Depois vieram os sorrisos de quem tem o prazer de rever amigos.Durante o período da academia não sabia o seu nome e o que fazia na vida.

Nunca faltava,sempre estava lá com o seu sorriso largo,sincero e de quem estava de bem com a vida.A todos tratava com atenção e carinho.Era o diferencial , no tocante à simpatia,daquela turma que abria a academia por volta das 5 da manhã.

Numa das minhas palestras sobre qualidade de vida tive o prazer de tê-la como ouvinte por algumas vezes.Depois nunca mais a vi. Eu havia deixado a academia por alguns anos e,necessitado da prática regular dos exercícios voltei depois de 3 anos.Não a encontrei nas primeiras semanas.

No hospital,como plantonista de cirurgia,fui chamado para avaliar uma paciente no 203.Era ela, até então, minha colega do sorriso bonito e largo da academia.Fiquei então sabendo o seu nome e a sua profissão,era professora e estava aposentada.

Não gostei do que as minhas mãos palparam naquele abdome. Uma massa tumoral um pouco menor do que uma laranja lima.Os olhos e a cor da pele me fizeram ver que o problema era grave apesar do semblante tranquilo da paciente.Estava diante de um grave problema e de uma paciente que iria dar grande lição a todos que a queriam e principalmente a mim.

Foram oito dias do internamento à cirurgia.Desde o começo eu fui claro sobre o prognóstico,o qual, ela recebeu com naturalidade e força que eu só estava acostumado a ver em pacientes especiais.E, ela, a professora M,mostrou-se para mim,uma paciente muito mais do que especial.

Minimizava as queixas de dores,os vômitos e o prurido insuportável causado pela impregnação da bilirrubina na pele.Sempre me recebia com o mesmo sorriso bonito e largo além de encantador.

Antes da cirurgia,ainda no leito do 203, uma queixa: estava com os lábios ressecados e frustrada por não estar de batom.Perguntei porque não havia usado o batom, respondeu-me que, os anestesistas não aprovam batom.Disse-lhe que algumas regras podem ser quebradas e que ela usasse o seu batom preferido.

Quando chequei na sala de cirurgia, lá estava, a professora M,com o seu sorriso de sempre e com o seu batom vermelho paixão.Descontraídos,sorrimos ante aquela natural tensão que nos acompanhava.

Pouco pude fazer como cirurgião.Tanto ela e a família ficaram sabendo que o prognóstico era o pior possível. No último dia que a vi consciente perguntei-lhe se estava cansada,respondeu que sim. Sobre se estava sentindo dor respondeu-me que não.

É natural que um paciente ante a um péssimo prognóstico reaja com indignação,rejeição e desespero. Em nenhum momento vi esses sentimentos por parte da professora M.

Em todo período mostrou-se animada,confiante,resignada e manteve até quando possível, o seu sorriso encantador.E, dessa maneira, concluiu seu ciclo entre nós dando a sua última e grande lição.

Eduardo Leite
gastroajuda@hotmail.com
A ÚLTIMA LIÇÃO DA PROFESSORA M A ÚLTIMA LIÇÃO DA PROFESSORA M Reviewed by Eduardo Leite on 11/15/2011 11:29:00 AM Rating: 5

Um comentário:

sandra disse...

Iluminado DR Edurado , sou sua Fâ sentimos tua falta por onde quer que vc vá , foi muito importante o seu trabalho nh HGCA seu livro é a pura verdade DEus te dê paz no coração .

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